Crise na classe média britânica impulsiona criação doméstica de maconha
Getty Images
Mas, a tendência tem se verificado também entre pessoas da classe média, e as razões alegadas vão desde segurança em não precisar se expor no contato com criminosos para adquirir a droga, até a uma forma de tornar o consumo mais barato.
Amy é uma alta executiva da região de Cheshire, no norte da Inglaterra, que também cultiva maconha no sótão de sua casa.
''Perto de onde eu vivo, há uns tipos suspeitos que estão traficando drogas. Mas nas vezes em que foram feitas buscas na casa deles, eu sorria e pensava: 'Vocês estão no lugar errado. Vocês deveriam estar aqui, esta é que é a casa em que as drogas estão', mas ninguém sabe disso'', afirma Amy, que não quis revelar seu nome verdadeiro.
Ela passou a cultivar a planta após um colega de trabalho tê-la ensinado como fazer. Ela vinha comprando a droga para seu companheiro, que sofre de esclerose múltipla, mas não se sentia à vontade em encontrar com traficantes em estacionamentos desertos.
Poucas semanas após ter aprendido a fazer uma colheita de qualidade em sua própria casa, Amy se tornou a mais recente agricultora de luxo do cultivo doméstico de maconha. Agora, ela usa os lucros gerados pelo cultivo com forma de incrementar a sua já considerável renda. Casos levantados pela BBC sugerem que há diversos casos parecidos com o dela na Grã-Bretanha.
Em uma época em que pessoas relativamente afluentes estão sentindo o peso da crise econômica, a oportunidade de ter um lucro rápido é algo que está se mostrando atraente para a classe média britânica.
"Vida confortável"
Amy afirma que o dinheiro livre de impostos ajuda-a a manter um estilo de vida confortável em uma parte do país conhecida por abrigar mansões ostentosas de jogadores de futebol.
''Não foi essa a minha motivação no início. Mas depois percebi quanto dinheiro eu conseguiria fazer com isso se eu levasse a coisa bem mais a sério'', afirma.
Usando jeans de grife e portando óculos escuros sobre a cabeça, Amy parece alguém que estaria mais à vontade em uma estação de esqui do que com traficantes de rua.
Mas, a despeito dos riscos associados ao uso frequente de maconha, ela não se sente pouco à vontade de fazer parte desta longa cadeia de comércio ilegal.
''Não estou forçando ninguém a consumir essas drogas. No final das contas, isso é algo que cabe a cada um. Todo mundo tem acesso à internet, todo mundo tem conhecimento dos efeitos que essas coisas têm, seja de primeira mão ou por ter lido a respeito. Cabe a cada pessoa e, penso eu, em pequenas quantidades, não é nada demais para a maior parte das pessoas'', afirma, com convicção.
Amy afirma que a o equipamento básico para o cultivo hidropônico de maconha custou cerca de 2 mil libras (cerca de R$ 5,5mil) e foi adquirido facilmente em lojas e pela internet. O cultivo hidropônico é uma técnica que não faz uso do solo, na qual as raízes das plantas recebem um solução contendo água e nutrientes essenciais ao desenvolvimento.
Ela vende drogas para um traficante local e seu lucro é de 5 mil libras (R$ 14 mil) a cada dez semanas, uma recompensa pela qual Amy acredita que justifica o risco de ser presa.
Não que ela ache que vai ser pega. Amy está confiante de que sua origem faz dela alguém acima de suspeitas:
''Vivo em uma casa muito bonita, com um imenso jardim e estou cercada de pessoas em situação semelhante à minha. Casais com filhos, profissionais. Acredito que meus vizinhos ficariam muito chocados se soubessem o que eu faço.''
Para Jas, um traficante da cidade de Wolverhampton, pessoas como Amy são os fornecedores ideais para alguém como ele, porque também acredita que pode evitar com mais facilidade ser rastreado pela polícia do que cultivadores que atuam em regiões mais pobres.
Jas explica que como a criação hidropônica de maconha envolve o uso de luz e de aquecimento, a polícia passou a saber identificar 'fazendas' de grande porte - onde a maconha é cultivada em cada cômodo de uma casa - por meio de helicópteros que sobrevoam as regiões suspeitas com sensores de calor.
É por isso que ele e outros traficantes deixaram de alugar casas inteiras para cultivar maconha e em vez disso estão buscando quartos individuais em bairros de subúrbio.
''De maneira geral, tenho muitos clientes para quem vendo maconha que são de classe média. Se digo para eles que eles podem faturar entre 2 a 3 mil em dez semanas, eles perguntam: 'como?' e eu respondo que 'eu preciso de um quarto emprestado'. A maior parte das pessoas que fazem isso para mim tem empregos. São pessoas genuinamente de bem.''
A polícia da região de West Midlands, na Inglaterra, afirma que o cultivo de maconha ainda é dominado por gangues de traficantes, mas contam já ter se deparado com ocorrências em apartamentos de luxo.
O traficante Jas cita o exemplo de seus forncedores, uma consultor de informática, que cultiva maconha em um quarto vago de sua casa.
''Se você o visse na rua, jamais pensaria que ele teria qualquer envolvimento com algo ilegal. Não creio que ele tenha sido preso ou feito algo errado em toda a sua vida. Ele me passou o contato de algumas outras pessoas que também estão interessadas.''
Frank, que também não quis divulgar seu nome verdadeiro, é outro criador de maconha dos sofisticados subúrbios de cidades britânicas.
Ele perdeu o emprego no ano passado e passou a alugar um quarto para um traficante de maconha de modo a enfrentar a pior fase da recessão. A oferta que ele recebeu foi de 2 mil libras (cerca de R$ 5,5 mil) por entre 8 a 10 semanas.
''Eu precisava do dinheiro na época. Ele (o traficante) era quieto, nunca incomodou ninguém, nunca fazia barulho. A minha mulher sabia disso e tolerou a coisa por seis meses, até que nossas finanças voltaram ao normal. E ele se retirou.''
''Nós estávamos preocupados em sermos pegos, mas, vivendo em uma casa de família, a polícia e os vizinhos não suspeitavam de nada. Eles pensavam que ele só estava vindo à nossa casa para tomar uma xícara de chá.''
Frank admite que se a situação ficar difícil novamente, vai retomar o cultivo de maconha sem hesitar, apesar de ter duas crianças em casa.
Mas a polícia afirma que pessoas como Frank e Amy não devem ser complacentes. ''Há muita ignorância a respeito disso. Proprietários que têm total controle sobre o local em que vivem, ou parte do local e que têm ciência de que atividades criminosas estão sendo realizadas ali não serão tratados de forma branda pelos tribunais. Eles correm o risco de pegar penas de até 14 anos de prisão.''
Nenhum comentário:
Postar um comentário