A chegada de novas tecnologias está alterando a antiga profissão , e quem não acompanhar esse ritmo acabará ficando para trás, diz o professor Bruno Salotti, coordenador da graduação em ciências contábeis da FEA-USP (Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo).
Foi-se o tempo em que o contador era o mero encarregado de registrar manualmente em livros cada ocorrência contábil do negócio. As atividades burocráticas da área passaram a ser cada vez menos feitas por humanos com a chegada da informática e, mais tarde, dos softwares especializados.
“O profissional deixou de produzir os dados e passou a analisá-los, com o objetivo de prever o impacto contábil de cada decisão de negócios”, diz Salotti.
Nesse sentido, deixou de olhar para o passado da empresa — o dinheiro que entrou e que saiu no mês anterior, por exemplo —, e passou a fazer projeções para seu futuro.
A automatização de processos em contabilidade transformou um trabalho burocrático em analítico, o que também abriu espaço para que ele pudesse se tornar gerencial: há anos, grandes empresas já contam com a figura do CAO (Chief Accounting Officer), uma posição de diretoria alternativa à do tradicional CFO (Chief Financial Officer).
O big data entra na conta
Para desempenhar funções cada vez mais estratégicas, o contador tem em mãos um recurso precioso: o big data.
“Além de ter conhecimentos profundos em contabilidade, hoje também é preciso dominar ferramentas de análise de big data e business intelligence”, diz José Carlos Fortes, contador e presidente da Fortes Tecnologia, empresa que desenvolve de softwares de gestão.
O profissional de contabilidade mais requisitado do momento, segundo ele, é uma espécie de “cientista de dados contábeis”.
Não é preciso entender de programação, necessariamente; mas é preciso ir muito além do Excel. “O novo contador precisa dominar ferramentas de gestão de dados, montar painéis de análise e extrair conclusões para orientar as decisões do negócio”, afirma o especialista.
Domínio do inglês é raro na área
Além da facilidade para lidar com o big data, o contador do século 21 também precisa ter pelo menos nível intermediário no idioma de Shakespeare para compreender e transmitir informações sobre a situação contábil do negócio — principalmente no caso de trabalhar em uma multinacional.
“Embora tenha havido uma melhora nos últimos anos, ainda é muito difícil encontrar candidatos que falem bem inglês, porque historicamente as vagas em contabilidade não exigiam essa competência”, explica Leonardo Berto, gerente de negócios da consultoria Robert Half.
Segundo o especialista, um contador especializado em tributos que domine o idioma é do tipo “mosca branca”: encontrá-lo é uma missão praticamente impossível.
O professor Salotti, da FEA-USP, diz que seus alunos são orientados em sala de aula a investir no inglês. “A faculdade tem disciplinas e provas em inglês, além de oferecer diversos programas de intercâmbio”, explica. “O estudante compreende desde cedo que, na carreira de contabilidade, inglês não é mais diferencial, mas requisito”.
Comportamento também importa — e muito
De acordo com o gerente da Robert Half, certas habilidades comportamentais específicas são fundamentais para se dar bem no mercado de contabilidade no Brasil.
Uma delas é a disposição para investir em atualização constante. “A pós-graduação em controladoria é o caminho natural de muitos contadores,”, explica Berto. “Como ensina a transformar números em estratégia, é um dos mais demandados pelo mercado”.
Mestrado ou MBA em auditoria, compliance, business intelligence, gestão e perícia contábil também estão entre as opções de pós-graduação mais quentes do momento na área, segundo Fortes.
Ter um perfil estudioso, porém, não é suficiente. Além de resiliência e capacidade de automotivação, o contador precisa ser hábil em relacionamentos interpessoais. “Uma demanda recorrente dos empregadores é por profissionais que saibam se comunicar e fazer a ponte entre o departamento contábil e outras áreas, como marketing, vendas ou operações”, diz Berto.
Salotti também destaca a capacidade de navegar pela interdisciplinaridade do mundo dos negócios. Além de ter um conhecimento profundo sobre a própria área, o contador também deve saber um pouco de economia, administração, estatística, direito e tecnologia.
“Quem tem uma sólida formação em ciências contábeis e uma visão panorâmica de outras áreas, além de fortes competências comportamentais, será um excelente candidato à diretoria de finanças de uma empresa”, diz o professor da FEA-USP.