Com medo da Lava-Jato, políticos buscam novo sistema eleitoral
Parlamentares retomam defesa de voto em lista, modelo em que eleitor escolhe o partido, e não mais o candidato, na eleição do Legislativo
O pânico disseminado pela investida da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra os políticos citados nas delações da Odebrecht faz vicejar no Congresso uma reforma que pode tirar do eleitor o direito de escolher seu candidato a deputado e vereador. Com medo de não conseguir se reeleger em razão do desgaste provocado pela Lava-Jato, os parlamentares querem implementar o voto em lista.
Pelo sistema, que cada vez ganha mais adeptos na Câmara, o eleitor vota apenas no partido. Cada legenda organiza internamente uma relação de candidatos, enumerados em ordem hierárquica. Conforme o número de votos obtidos, os partidos conquistam determinada quantidade de mandatos, dados aos primeiros da lista.
O mecanismo tem como principais patrocinadores os presidentes do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ambos alvo de pedidos de inquéritos da PGR no Supremo Tribunal Federal. No discurso oficial, sustentam que a lista fechada e preordenada é o formato mais transparente, reduz gastos com as campanhas eleitorais e obriga os partidos a se manterem fiéis à identidade dos seus programas.
— Defendo a lista de forma bem prática. É o sistema que tem um custo menor e fortalece o debate ideológico — diz Maia.
No Congresso, essa discussão é fomentada pelo sentimento generalizado de que a maior parte das lideranças partidárias terá muita dificuldade nas eleições de 2018. A descrença da população nos partidos tradicionais e o êxito alcançado por candidatos que adotaram uma atitude antipolítica, como João Dória (PSDB) na prefeitura de São Paulo, preocupam sobretudo os caciques regionais. Presidente do DEM no Rio, Maia foi apenas o 29º deputado mais votado em 2014, com uma soma nove vezes inferior à do campeão, Jair Bolsonaro (PSC).
Com a lista fechada, para os candidatos será mais importante ter influência no partido do que prestígio popular. Dessa forma, uma boa colocação na nominata praticamente garante a eleição.
— O voto em lista realmente fortalece os partidos, mas é preciso estabelecer critérios que garantam uma democracia interna. Do contrário, o eleitor ficará submetido aos chefetes partidários — diz o advogado e ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Luiz Carlos Madeira.
O modelo mantém vícios do atual sistema, como a inclinação dos partidos a buscarem os puxadores de votos, como celebridades, pastores evangélicos e ex-jogadores de futebol. Nas eleições de 2014, os campeões de votos para a Câmara foram o apresentador de TV Celso Russomano (PRB-SP) e o palhaço Tiririca (PR-SP). Pelo sistema em lista, eles inevitavelmente estariam no topo da relação apresentada pelos respectivos partidos. A mudança nas regras será debatida na Comissão da Reforma Política em curso na Câmara.
Os deputados também desejam criar um fundo eleitoral exclusivo para o custeio das campanhas, nos mesmos moldes do atual fundo partidário. Um dos entusiastas da iniciativa é o presidente do TSE, Gilmar Mendes, também árduo defensor do voto em lista. Nas reuniões que tem conduzido para discutir o assunto, sempre recorre a um levantamento do cientista político e conselheiro do TSE Antônio Lavareda, pelo qual os 513 deputados federais eleitos em 2014 declararam gasto de R$ 5 bilhões. A cifra é inferior ao orçamento anual do fundo partidário e não contabiliza os recursos gastos via caixa 2. Para o presidente da Corte, seriam necessários R$ 15 bilhões nas eleições de 2018.
— Não adianta nada o financiamento público com o sistema que temos hoje. Foi ele que permitiu uma proliferação enorme de partidos, dificuldades de financiamento e todas essas distorções — avalia Gilmar Mendes.