quarta-feira, 6 de julho de 2011

Juros altos é culpa do Ministro da Fazenda

Gustavo Franco: “Culpa dos juros altos no Brasil é do ministro da Fazenda”

Em palestra no Instituto Millenium, o ex-presidente do Banco Central disse que “os nossos netos pagarão a conta da farra fiscal”

 
Raul Junior/VOCÊ S/A
Gustavo Franco
Franco: "Juros ridiculamente altos para manter as contas gregas do Estado brasileiro"

São Paulo – O ex-presidente do Banco Central, Gustavo Franco, disse nesta terça-feira (5) que “o ministro da Fazenda é o culpado pelos juros altos no Brasil”.
 
A afirmação foi feita durante participação no ciclo “Brasil, presente e futuro” na Casa do Saber Rio a convite do Instituto Millenium, que transmitiu o evento via internet.
Franco ressaltou que o Brasil tem gastos públicos de padrão “grego”. “Quem é o culpado pelos juros altos? Não é o Banco Central. Juros altos são fruto de gastos elevados, ou seja, a culpa é do Ministério da Fazenda. O Banco Central é apenas o sistema imunológico, quem produz e alimenta a doença é o ministro da Fazenda”, afirmou, sem citar o nome do atual ocupante do cargo, Guido Mantega.

O economista afirmou que a taxa Selic (juros básicos) é o principal instrumento para esfriar ou aquecer a economia. O problema, segundo ele, é que o Brasil ainda não se livrou de todos os males da indexação que existiam na época da hiperinflação. “Essa infecção não foi totalmente eliminada. Ainda temos a bactéria no organismo, menor do que na época da hiperinflação, é claro, mas ainda relevante.”

Franco, que foi presidente do Banco Central no primeiro governo Fernando Henrique Cardoso, enfatizou o enorme rombo nas contas públicas. “Temos superávit primário de 2% a 3% do PIB, mas quando se colocam os juros e as amortizações nos cálculos, passa para menos 19%. Sabe quanto é na Grécia? 21% do PIB. Em Portugal é 18%.”

O economista prosseguiu: Por que aqui isso não é problema no Brasil? Porque a mecânica de financiamento tem muito a ver com os fundos DI. Estamos (população que investe em títulos públicos), sem saber, carregando a dívida e mantendo a rolagem. Na Grécia não tem overnight, não tem cultura de depósitos à vista remunerados atrelados a títulos públicos. Como a gente tem isso aqui, a gente consegue viver dentro de uma relativa normalidade.”

Gustavo Franco disse que “hoje precisamos de juros ridiculamente altos para manter o Estado brasileiro, que tem contas gregas". "Se o juro cai muito abaixo de 10%, esse mecanismo de rolagem da dívida interna começa a se desmilinguir e chega a necessidade de amortizar a dívida, mas não temos dinheiro para isso. O fato é que o custo da farra fiscal é transformado em dívida pública, que demanda juros altos, e a conta será paga pelos nossos netos. Os juros altos de hoje são os impostos de amanhã, das próximas gerações.”

O ex-presidente do Banco Central sugere que seja feito um “choque fiscal rigoroso que permita, num prazo de dois anos, que o Brasil tenha juros nominais de 6% e que o crescimento seja impulsionado pelo setor privado, algo que nunca tivemos no país.”
 
O problema, diz ele, é que “Brasília não acredita nesse modelo, acha que isso é coisa de neoliberal. Na minha opinião, essa é a nova equação do crescimento, na verdade, a única viável que existe".
Questionado sobre o spread bancário elevado no Brasil, Franco disse que”a culpa é do depósito compulsório, sem remuneração". "De cada real captado, (o banco) tem de depositar 50 centavos no Banco Central. Portanto, (o banqueiro) tem que dobrar a taxa de juros para rentabilizar um real podendo emprestar apenas 50 centavos. Há ainda a obrigação de emprestar 50% dos depósitos da poupança para habitação e outras regras, além de impostos como o IOF. Enfim, é carga tributária sobre o crédito que explica o spread elevado."

Em sua a palestra “A incrível história da moeda e da hiperinflação do Brasil”, Franco contou a história da implantação do Plano Real, que completou 17 anos no dia primeiro deste mês. O economista ressaltou que a “hiperinflação foi uma tragédia para a sociedade brasileira". "Foi um fenômeno, o único no mundo, que aconteceu sem guerras”.

Entre as prioridades estabelecidas na época da implantação do Plano Real, estava a desindexação da economia. “Para isso, entrou em vigor a determinação de que os contratos só podem ser reajustados em prazo superior a um ano e com base em índice de preços. Foram abolidos a Ufir e outros mecanismos de correção que competiam e disputavam o espaço com a moeda brasileira.”

Franco explicou por que não se deve acabar totalmente com os reajustes. “A correção monetária é importante nos contratos de longo prazo para proteger os dois lados do contrato.”

Na época anterior ao Plano Real, o Conselho Monetário Nacional, que define a meta de inflação, tinha a participação de vários ministros. “Tiramos todo mundo que não tinha preocupação com a saúde da moeda. Nós queríamos só a Fazenda e o Banco Central no Conselho Monetário, mas tivemos que incluir o Planejamento”, contou o economista.

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