"Success case", "ready to market", "shelf life", "focus group". As palavras em inglês fluem naturalmente para Antonio Augusto De Toni, um catarinense com mais de 20 anos de experiência no setor de frigoríficos, que hoje ocupa o cargo de vice-presidente de mercado externo da Brasil Foods (BRF), empresa que surgiu da fusão de Sadia e Perdigão.
Todas às segundas-feiras, às 7h30 da manhã, Toni comanda uma conferência telefônica com 30 países, conectando 19 escritórios da companhia espalhados pelo mundo. Na reunião, repassam metas semanais, discutem cenários para o câmbio, trocam informações. A língua franca é o inglês, já que na BRF hoje trabalham funcionários de 25 nacionalidades, que falam 16 idiomas.
Fundada em Videira (Perdigão) e Concórdia (Sadia), cidadezinhas do interior de Santa Catarina, a BRF prepara-se para um voo internacional ambicioso. A empresa quer se tornar uma multinacional no sentido completo da palavra, a exemplo de Nestlé e Danone.
Dar esse salto se tornou quase uma necessidade para a BRF, que enfrenta dificuldades para crescer no Brasil depois que foi obrigada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) a vender fábricas e marcas para reduzir a concentração de mercado criada pela fusão.
Com a intenção de alavancar a expansão internacional, a empresa contratou as consultorias Future Brand e Ipsos para traçar uma estratégia para a marca Sadia no exterior. Foram 180 grupos de trabalho, com 7 mil consumidores entrevistados em 20 países, em um estudo que começou no segundo semestre de 2010 e está sendo finalizado agora.
A Sadia vai ser posicionada como marca premium. Na África, por exemplo, a marca será "relançada" em 16 países. As embalagens foram reformuladas. Na Alemanha, o fundo amarelo denota produto barato e foi trocado pelo branco.
De acordo com Toni, esse é apenas o primeiro passo, porque o objetivo é levar para o exterior os três pilares que caracterizam uma multinacional: produção eficiente, marca própria e distribuição capilarizada. "Queremos replicar o 'success case' do Brasil lá fora", diz o executivo.
Pouco internacionalizada. A Brasil Foods vende para 140 países e possui sete fábricas no exterior, empregando 2.570 pessoas. É pouco. A empresa é a quarta maior exportadora do País, mas aparece apenas na 14.ª posição entre as empresas mais internacionalizadas em ranking da Fundação Dom Cabral.
No exterior, a BRF controla apenas 40% da sua distribuição e 38% do que foi vendido lá fora chegou com a marca Sadia ao consumidor. O restante foi direcionado ao mercado de food service (restaurantes e refeições corporativas). A produção é o pilar menos internacionalizado - apenas 5% da exportação são processados fora do País. A meta é chegar a 20%.
A empresa não pretende deixar de produzir os frangos no Brasil, que afinal é um dos países com menores custos do mundo, mas a industrialização no exterior dá flexibilidade para trocar sabores e aumentar o tempo de validade do produto na prateleira do supermercado.
Na troca de ativos com o Marfrig, para cumprir os compromissos assumidos com o Cade, a BRF levou fábricas na Argentina. A Perdigão já tinha comprado uma empresa na Europa, mas a Sadia foi obrigada a vender sua unidade na Rússia.
Agora a BRF está investindo US$ 120 milhões em uma fábrica em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes. Também quer montar uma unidade na China, onde acaba de fechar uma joint venture para distribuição, e já decidiu construir uma nova fábrica nas Américas, mas não revela o país.
De acordo com Wilson Mello Neto, vice-presidente de assuntos corporativos da BRF, na medida em que os países forem ganhando "musculatura" também vão conquistar independência administrativa. Na Argentina, a BRF já possui um CEO, que se reporta diretamente ao presidente da empresa.
Desafios. Criar uma marca global é uma tarefa dificílima. Companhias brasileiras que se tornaram gigantes no exterior cresceram comprando marcas já consagradas. É o caso da AB Inbev, que comprou a Budweiser nos Estados Unidos em vez de levar a Brahma para brigar lá fora.
"Hoje o avanço nas tecnologias de produção fizeram com que os atributos funcionais dos produtos sejam muito parecidos em qualquer lugar do mundo. O segredo da marca são os valores subjetivos que estão embutidos", diz o professor da FIA/Provar (Programa de Administração de Varejo), João Lazzarini.
Para Eduardo Tomiya, diretor-geral da Brandanalytics, um dos principais desafios da BRF será convencer as redes de varejo no exterior a cederem espaço na gôndola para a marca Sadia, que ainda é pouco conhecida em muitos mercados. "O relacionamento com o varejo já é difícil no Brasil. Imagina lá fora", diz.
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